quinta-feira, 26 de junho de 2014

Arrebentado


acordei no meio da noite
a noite me acordou ao meio
tanto faz
o que me fazia querer gritar
no meio da mudez de uma noite
escura e fria
era o meu desespero por poder
reconhecer – no meio da noite
e no meio de mim mesmo –
aquelas vozes que rasgavam
meus ouvidos
numa dor aguda e silenciosa
estou cortado, machucado, ferido
por essas vozes que ecoam no oco
são versos tecidos pela mão do impossível
são melodias compostas num instrumento
inexistente
são palavras ditas por lábios
secos e rachados como uma terra árida
feito ácido corroendo tudo por dentro
a palavra é veneno quando não dita
e a noite continua ao meio e continuo
ao meio
tentando me juntar pra não morrer
no meio, ao meio, na noite
mas não quero morrer inteiro e
me jogo, me lanço ao chão como
como um vaso arremessado
por mãos furiosas que desejam quebrar
tudo e todos na esperança de romper
a si mesmo
num momento de fúria
quebro-me
despedaço-me
esqueci de ser
inteiro.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Algemas


entre achados e perdidos
: eu me perco me escondo
finjo que não existo
além das margens
do imenso – e
insecável – mar da tua alma
: você
entre o sim e o não
um talvez que me lança
algemas inquebráveis
e eu cada vez mais enclausurado
não vejo
outra forma de ser
livre senão preso, atado.
não há liberdade
sendo livre.
sem saber nadar
sem saber viver
sem saber amar
sem saber
sem
repetições vazias esquecidas
de fazer rima
em meu peito há um imã
e agora há também
uma rima
que te atrai
e você se trai
nessas palavras tão mornas
sim, entre o quente e o frio:
você
morno você
quente e frio você essa mistura
que me dá náuseas.
e a minha garganta
latejando o gosto da bile
corroendo a mim a ti e todas
as feridas esquecidas
de doer.