segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Mudei tudo. Só não mudei de casa.


Tantas cores. Tantos sabores. Tantos amores. Tantos sonhos. Tantas esperanças. Tanto querer. Hoje sei que a mudança está acontecendo. Do lado de fora, aparentemente, nada mudou. Tudo continua da mesma forma. Mas, dentro de mim, tudo está ao contrário. E acho que está de cabeça pra baixo. Do lado avesso. O contrário de mim. Esse sim me faz feliz. Esqueci meus medos e minhas concepções do que era certo e errado para simplesmente escolher o caminho da felicidade.
Se eu pudesse escrever tudo que aconteceu em meu interior esse ano, eu não seria capaz. Seria preciso folhas, folhas e mais folhas. E, ainda assim, seria insuficiente. Porque, as mudanças que acontecem em nós, são grandiosas. Um pequeno detalhe, uma pequena cor, um pequeno movimento, é capaz de mudar a nossa vida, a nossa história.
Mudei. Mudei os móveis de lugar. Mudei a roupa de cama. Mudei as cores. Mudei tudo. Só não mudei de casa. Tirei os tapetes. Varri a sujeira acumulada escondida debaixo deles. Quis meu coração limpinho. E ainda o quero assim. Pois sei o quanto preciso que o meu coração tenha rastros de bondade. Não foi fácil. Sangrei. Chorei por dentro. E as pessoas que me olhavam não viam minhas lágrimas. Mas eu e Deus sabíamos de tudo que se passava aqui dentro. Cada mover de um móvel dentro da minha pequenina casa-coração era uma dor discreta em meu peito. Mas depois a dor sempre passava. Foi um dos aprendizados mais bonitos que eu tive esse ano. Toda dor passa. Não importa o tempo que demore. A dor não é eterna. A dor não dura pra sempre. Ainda que ela te esmague o coração e furte todas as suas forças. Ela passa. Nossa vida não é feita só de branduras e paz. Sabemos bem disso.
A dor mais intensa que vivi esse ano foi ver minha irmã em coma induzido. Sua vida estava por fio. E foi por esse fio que Deus a salvou. Deus é tão grande e tão maravilhoso que, nas coisas mais frágeis, manifesta a sua força e o seu amor incomparável. Quando todos achavam que era o fim, que a vida da minha irmã havia se findado, veio uma luz e levou embora toda escuridão. Foi num dia de sol. Num fim de tarde. Onde eu sentia o peso da quase partida. Deus olhou com compaixão para nossas lágrimas e as enxugou. E derramou remédio sobre a vida da minha irmã. Dia após dia ela foi se recuperando. Os médicos estavam sem esperança. E eles mesmos reconheceram ali um milagre. Foi na fragilidade do fio que a vida da minha irmã foi resgatada. E eu agradecerei a Deus a cada instante por esse fio que ainda mantinha a vida da minha irmã aqui conosco. A dor passou. E a alegria do retorno se fez presente em nosso meio. Minha irmã está bem e saudável. Desculpa, mas ainda existe gente que não crê na existência Deus. Não sei como. Não julgo, não condeno e nem faço cara feia. Somos livres para crer e não crer. Mas ainda me entristece a incredulidade de muitos.
Aquela dor, de não conseguir viver dentro de mim, me abandonou a alma. Agora me sinto livre daquele desconforto insuportável que me causava as paredes do meu quarto escuro. Na verdade, o meu quarto não está mais escuro. Abri portas e janelas e permiti que a luz entrasse. A luz invadiu cada canto e aquilo que eu não queria ver se tornou parte da minha vida. Rasgou-me todas as roupas que vestiam e pesavam minha alma. Deixou-me completamente nu. E me mostrou quem eu sou. A busca por ser quem somos e para que nascemos, é uma busca que jamais terá fim. Mas há momentos em que essa busca encontra respostas intensas. A maior resposta eu encontrei quando me permiti olhar frente ao espelho de minha alma. E não desviar o rosto e não fazer cara feia e não sentir nojo e não sentir repulsa e não sentir mais vontade de fugir. Simplesmente abraçar a nudez da minha alma e acolher em meus próprios braços. Sou quem sou. E sou feliz por ser assim. Não sou doce. Não sou azedo. Não sou salgado e nem amargo. Sou tudo ou até mesmo nada. Mas sou. Sou aquilo que você vê e tudo aquilo que se esconde nas entrelinhas e nas sombras do que escrevo. E escrevo na ânsia me fazer livre das correntes que ainda tentam me aprisionar dentro de mim. Porque amar é libertar-se de si para morar no coração de alguém.
O que mais querer se não amar? E não me refiro ao amor entre um homem e uma mulher, ou entre dois homens, ou entre duas mulheres. Refiro-me ao amor que precisa nos habitar sempre. O amor que nos mantem vivos. Nasci para amar. Para manifestar esse amor em gestos simples. Palavras escritas. Palavras ditas. Silêncios. Olhares e abraços. Em cada coisa que faço preciso ser amor. Esse amor puro que parece ter sido maculado pelo nosso orgulho e superficialidade. Não deixe o amor morrer. Ame mais. Não, não diga que você ama. Apenas ame. E só.
Sinto-me agora diante de uma porta fechada. Estou pronto para abri-la. A porta tem um número estampado. 2013. Não sei e ninguém sabe o que há atrás da porta. Somente saberei se tiver a audácia e a coragem de abri-la. Quero abrir. Quero saber o que há. Que me despedir com um sorriso emoldurado no rosto e com o coração saltitante de gratidão por 2012. Quero ir. Já disse, mas preciso repetir. Minha sina não é ficar. Por isso, eu vou. Venha comigo. Me dá aqui sua mão. Eu também tenho medo de vez em quando. Mas juntos a gente consegue. Não seja tão orgulhoso. Nós precisamos um dos outros. E reconhecer isso também é saber-se limitado.
Vamos juntos. A porta precisa se abrir. Vamos seguir. Sempre em frente.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Eu me afoguei


Queria poder me rasgar inteiro para te enfiar dentro de mim e te fazer ficar comigo pra sempre. Colado em minha existência.  Grudado em minhas carências. Enraizado em meu peito machucado por tantos nãos que meus ouvidos receberam. Sim, eu sei que a vida não é feita somente de sins. Mas o não sempre machuca um pouco. E, de não em não, a ferida vai ficando maior, e, o desejo de ser curado por um doce sim, aumenta.
O meu desejo aumentou à medida que você estava mais perto de mim. Quanto menor a distância, maior é o perigo. Sempre quis viver assim. Correndo esses tremendos riscos e esses perigos. Eu disse sim de repente e você correspondeu ao meu chamado. Nossos sins se encontraram e você chegou perto demais. Um beijo me toca a alma. E, além disso, eu só posso querer mergulhar de cabeça na alma do outro. Mesmo não sabendo nadar. Mesmo quando sua alma me parece ser um imenso mar que provoca meus medos de criança.
O medo tentou me abraçar a alma, mas fugi do seu enlace. Fugi pra longe e perdi o medo de me deixar envolver por teus braços. São dois lados. Os dois são convidativos. De um lado, o medo me dizendo que é perigoso demais, que posso me afogar, que posso me perder e nunca mais encontrar o meu porto seguro. Só que existe o outro lado. Os teus braços. Os braços que pareciam ser o meu porto seguro. Pena que nem todo porto se mantem seguro pra sempre. Naquele instante em que mergulhei em você, esqueci de mim. Somente te queria em mim. E a cada segundo, a cada batida do meu coração, a cada respiração, a cada beijo, a cada toque, a cada arrepiar, eu te queria mais. Mergulhava em você. Nadava em você. Não queria mais a superfície ou a segurança da terra firme. De alguma forma eu me sentia seguro em tuas águas. Elas me faziam bem. Elas me convidavam pra ir mais fundo e esquecer de tudo. Eu esqueci cada pequeno detalhe que me assombrava.
Eu me afoguei. Você não me queria mais em tuas águas. Eu me senti uma sujeira indesejável. Terrível é ficar onde você não é bem-vindo. Triste é querer permanecer quando estão te apontando a porta de saída. Angustiante é querer abraçar quem está com os braços cruzados. Eu quis saber o porquê. Eu quis te entender. Eu quis uma explicação. Eu não entendo porque você me convidou a nadar em tuas águas pra depois me fazer afogar nelas. Sei que meu querer, às vezes, sufoca alguns corações. Mas eu te queria tão baixinho. Meu querer nunca foi tão manso. Mas você era mais um ‘não’ na minha vida. Talvez um sim que iria se transformar em não. Na vida é assim, a gente mergulha pra depois se afogar. Vez em quando até morremos. A verdade é que eu morri em você. E agora eu quero ressuscitar em outro coração, em outros braços, em outro olhar, em outros lábios. Para poder nadar sem medo de me afogar de novo. Sem medo de morrer mais uma vez. A vida também é feita de mortes. Um dia a gente morre e no outro dia a gente ressuscita.
Por favor, vem para que eu ressuscite.


quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Escravizados por um sentimento


Amar é uma experiência maravilhosa. Apesar de saber que também pode ser bem dolorosa. Aquela dor bem aguda pode atingir as profundezas do nosso ser. E nem sempre há um remédio que cure essa dor. O amor vez em quando me parece ser uma dor incurável. Mas, no fundo, sei bem que sempre há um momento de brandura, de paz e de alívio. O amor não é feito só de dor, assim como não é feito só de jardim florido e passarinhos voando e cantando livremente num dia ensolarado. E por mais que eu tente dizer o que é o amor, mais ele fica incompreensível aos meus sentimentos (im)perfeitamente humanos.
Apesar de achar o amor um dos sentimentos mais bonitos que existe, penso que ele pode ser um muito perigoso para quem não sabe lidar com ele. O amor é forte ao mesmo tempo em que é frágil. Sem cuidado, o amor não dura. Sem cuidado, o amor só fere e nunca cura. O amor é um mistério que nossa alma deseja desvendar. Quanto mais se tenta, mais se ama. Talvez esse seja o segredo de amar. Tentar amar, sentir que não consegue amar, e, sem saber que está amando, amar. O amor acontece quando estamos um pouco distraídos e despercebidos. Quando de repente nos deparamos já estamos mergulhados e completamente imersos na imensidão desse mistério.
E como cuidar? Eu não sei. Acho que ninguém tem uma lista com dicas. Você tem? Se tiver, por favor, me mostre. Pois eu queria muito aprender a amar sem nunca deixar-me escravizar por esse sentimento. Infelizmente muita gente acaba assim. Escravo do que sente. Muita gente perde a vontade de viver sua própria vida pra viver a vida do outro. Muita gente deixa o outro imprimir seus sonhos, desejos e gostos em seu coração. Muita gente nem se conhece mais, porque se perdeu tentando encontrar um caminho pra chegar mais perto do coração do outro. Muita gente perdeu a dignidade porque queria só mais uma migalha do amor, da atenção, do afeto e do carinho do outro.
Até onde nós chegaríamos para ter aquela pessoa ao nosso lado? Não sei. Mas penso que não temos limites quando se trata de querer se sentir amado por alguém. Todo mundo gosta de receber amor. Cada um de nós nasce com essa carência grudada na pele. Precisamos de palavras, gestos ou de qualquer outra coisa que acenda a luz e diga ao nosso coração que tudo está bem. E que existe amor no outro. É terrível perceber que esquecemos o nosso amor próprio quando estamos amando alguém.  Não importa se o outro fica no talvez, na dúvida, na incerteza, no silêncio. A gente se contenta com palavras gotejadas no dia-a-dia ou de vez em quando ou de-vez-em-nunca. A gente se submete na esperança de que um dia o tal amor possa dizer que sim, que tudo está certo, que ele sente o mesmo, que vocês vão poder dar as mãos novamente e caminhar lado a lado. E tentar reescrever uma nova história ou, quem sabe, continuar escrevendo uma história que ainda não acabou.
Mas pena que a gente se cansa um dia. Um dia o cansaço nos faz abrir os olhos e ver que o outro não merece estar ocupando todos os espaços da nossa vida e das nossas esperas. E que não dá mais pra alimentar a alma sedenta de amor só de palavras e promessas que nunca se cumprem. Não basta só dizer que ama. O amor não é feito só de palavras. Seria tão bom se fosse. Amar seria mais fácil se fosse só dizer que ama. Mas amar não é só isso. As palavras que não são acompanhadas de atitudes se tornam palavras vaziam e morrem dentro da gente. E, o pior, acabam morrendo junto com a nossa esperança. Porque, querendo ou não, a gente sempre espera que algo mude e que as palavras deixem de ser só palavras, para se transformarem em ação.
Sei que há muitas pessoas já ciaram nesse precipício e nem sabe mais como voltar. As palavras ilusórias foram atraindo cegamente seu coração para o abismo profundo da desilusão. Muitas vezes isso acontece. O outro chega, diz meia dúzia de palavras que a gente gosta de ouvir e depois que conseguiu o que queria, se vai sem deixar vestígios de que irá voltar. E você continua aí, dentro desse abismo, esperando que ele volte pra te buscar. Desculpa, mas nem sempre o outro volta. Há pessoas que se vão pra nunca mais voltar. Fazem o estrago e deixa a gente pra aprender a se cuidar e a se curar.
Por favor, aprenda a escalar esse abismo. Não espere mais. Não se iluda mais. Sei que as palavras molhadas pelo veneno da ilusão ainda ecoam dentro de você. Mas não desista agora de você. Olhe pra cima. Ou melhor, olhe pra dentro de você. Sei que dói ainda. Sei que a ferida ainda está aberta. Mas se você se fechar as coisas só vão piorar. Entenda, ou tente entender, que nem todo mundo sabe o que é amor de verdade. As pessoas entendem mais de corpo a corpo, boca na boca e só. Muitos estão vazios. Mas você sabe que ainda existe amor aí dentro desse teu peito surrado de tanto sentir as dores dessa vida. E é esse amor que te mantem vivo e que te faz querer viver de novo. Não deixe mais que o outro leve a sua vida junto com ele. Não se prenda mais aos passos que não quiseram ficar e nem às promessas que não quiseram se cumprir. Acredite que você é bem maior que isso. Sei que é difícil sentir que existe uma saída. Mas existe. Sempre existe.
O amor é essa esperança que nunca morre dentro de nós. Enquanto houver amor sempre haverá esperança. Quebre as correntes que ainda te prende. Você não nasceu preso a ninguém. Você nasceu livre. Você nasceu passarinho que não foi feito pra viver engaiolado. Veja-se livre e queira ser livre. Livre do domínio do outro. Ainda que esse domínio seja quase imperceptível ou sútil. Voe, passarinho. Voe para outro ninho. Não fiquei mais no meio desses espinhos esperando que alguém venha te curar. Vá buscar sua cura em outro lugar. Peço agora que você vá. A gaiola está aberta. É só voar. Acredite. O amor te fará alçar voo. Alcance o que é seu. Queira somente o que é seu. Não queira mais o que é dos outros. Talvez só assim o outro volte um dia. Ou não. O importante é que você já sabe a verdade. Você é livre. E pode voar.
Voe.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Mordidas delicadas em minha alma


Tatuei a tua pele com o dedilhar dos meus dedos sensíveis e, ao mesmo tempo, urgentes. Não queria sentir apenas teu corpo sobre o meu, tua pele deslizando na minha pele, tuas mãos tocando com firmeza meu corpo.  Quisera eu que tuas mãos varassem minha pele e tocassem o lugar mais profundo, secreto e escondido da minha alma. Eu te deixaria ir aonde ninguém mais foi. Nem mesmo aquele a quem eu entreguei o sentimento mais puro que já pode existir em mim.
Mas, de mim, eu queria te dar absolutamente tudo. Todo esse amor cravado nas profundas da minha existência. Acho que existo tanto para o amor, que não consigo me imaginar sem ele me rondando o olhar, as palavras, os gestos, o caminhar, o respirar. Meu beijo era entrega. Meu olhar era entrega. Meus olhos fechados eram uma entrega e confiança total em você. Meu toque era entrega e dizia o quanto te queria. Queria-te tão junto a minha pele que precisava te abraçar bem forte junto ao meu corpo. Minhas mãos queriam submergir teu corpo até te tocar por dentro somente pra te ver sentir o quanto o meu desejo era intenso.
Teus beijos me mordiam a alma delicadamente e eu só queria mais e mais e mais um pouco e de novo. Até que você devorasse por inteiro. Já não quero mais o toque que não toca ou o beijo que não beija. Quero tudo verdadeiro e real. Quero a tua alma nua deitada sobre minha cama desfeita, para que eu possa aconchegar a minha alma sedenta. Só quero me enrolar nos teus braços e me deixar aquecer até que o dia passe, e possa olhar-te nos olhos em silêncio e dizer o quanto estou feliz por te ter do meu lado.
Com meus olhos enxergo além do que você conseguiria imaginar. Você vê a superfície. Vê meu nariz vermelho. Minha pele exageradamente branca. Meu cabelo bagunçado. Você não vê o quanto te quero. Eu tentava te olhar nos olhos. Mas meus olhos não conseguiram encontrar um caminho até os teus. Então silenciei. Adormeci todas as minhas palavras em tua pele morena. E agora só espero que depois da tua partida você ainda se lembre de mim. Esqueci tanta coisa em você. Volte para buscar o teu corpo que ainda está deitado sobre minha cama. Não suporto mais olhar pra ela e te ver. Não consigo sentir teu cheiro sem ficar inebriado e sentir um salto repentino em meu estômago. Preciso me desintoxicar do teu perfume. Preciso me livrar dos teus olhos compenetrados nos meus. Preciso me livrar do teu rosto grudado em minhas mãos. Preciso me livrar dos teus dedos sobre meu pescoço. Do que preciso não sei o que terei. Sigo assim. Precisando. E só.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Cuidar de mim


Pensava que eu tinha braços de borracha e que eu podia abraçar o mundo inteiro e trazer cada pessoa pra junto do meu peito.  Pensava que eu podia enxugar todas as lágrimas, descansar todos os corações cansados, dar colo aos corações carentes, dar abrigo nos dias de tempestade aos corações amedrontados e angustiados. Mas eu nunca pude fazer tudo. E até me senti frustrado por não poder ser o que eu sempre quis ser. Eu sempre quis ser mais. Nunca me importei com os limites do meu corpo e da minha vida que dizem que eu não posso e que não há como abraçar o mundo sem antes me abraçar primeiro.
Pode parecer estranho e meio dramático, mas eu não sabia cuidar de mim. Eu cuidava melhor dos outros do que de mim mesmo. Recebia a vida do outro em meus braços, mas os cruzava para a minha própria vida. Acho que eu vivia mais a vida dos outros do que a minha. E aí vivia de adiar o que estava pedindo uma resposta e uma decisão definitiva. Quando chegou a distância, o afastamento, a lonjura dos corpos e até dos corações, pude perceber o quanto deixei a vida passar sem vivê-la como devia. Deixei de me dar amor, carinho e atenção. Esqueci das minhas feridas para cuidar de outras. Não me arrependo disso. Jamais vou me arrepender de ter feito o que fiz ou do que faço. Se faço, pode ter certeza, que faço com amor. Não faço pra te pedir algo em troca. Se derramo remédios e faço curativo sobre tuas feridas, é porque assim sinto que devo fazer. Essa é a minha missão. Mas não posso jamais esquecer que dentro de mim existe imensas feridas precisando de cuidados. Esqueci muitas vezes de mim. E me esqueci em muitos corações na esperança de que, as pessoas me tinham, fossem me cuidar com o mesmo amor. No entanto, nem todo mundo cuida, nem todo mundo quer se sentir responsável por cuidar das feridas de alguém.
Cada um precisa aprender a cuidar de si mesmo. O outro chega e um dia infelizmente pode ir embora. Mas nós estamos sempre ao nosso lado. Não tem como sair de dentro de nós mesmos e tirar férias. Por mais que queiramos isso é impossível. Eu não queria e nem quero mais viver outra vida. Quero viver a vida que tenho. A vida que Deus soprou em meu corpo pequeno, magro e frágil. Já quis fazer as malas, arrumar tudo, escrever carta de despedida que faz chorar e me mandar daqui dentro de mim. Não suportava a minha realidade. Não suportava fechar os olhos e me ver no espelho da minha alma. Eu sempre via o que não queria viver. Pesadelo. Horror. Angústia. Tudo me comprimia como meu corpo comprimi a minha alma dentro de mim. Queria uma resposta. Queria uma solução pra tudo isso. E era tão simples, tão fácil, tão real. Era só abrir os braços e me receber como aquele pai que recebe o filho depois de ter partido para uma longa viagem.
O cansaço me fez abrir os braços. Me recebi como nunca recebi outra pessoa. Aceitei o que sou e o que nasci pra ser. Lá, há uns mais ou menos vinte anos atrás, quando era gerado no útero da minha mãe, me foi concedido a graça de ser o que sou. Foi germinado em minha alma a minha missão, o meu querer, a minha responsabilidade, os meus desejos, os meus segredos. Tudo de mim começou quando eu comecei a ser formado e tecido.  E me abraçar foi como voltar ao útero de minha mãe para reconhecer que já nasci assim. Condicionado a sentir mais do que devo sentir. Condicionado a amar demais. Condicionado a deixar pedaços de mim por onde passo. Condicionado a olhar além do corpo. Ver a alma. Ver o que ninguém é capaz de ver, e sentir o que ninguém seria capaz de sentir. Ver beleza onde tudo mundo só vê feiura. Às vezes, eu me confundo com as pessoas. Olho e acabo sentindo o que ela sente. É estranho. Eu sei que é. Vez em quando eu nem entendo. Mas sentimento a gente não entende. Apenas sente.
Agora sei. Agora sinto. Agora vejo. Posso cuidar de mim. Posso me embalar entre meus braços. Posso me dar amor. Posso direcionar meus passos. Posso escolher meus caminhos. Posso ser mais feliz. E posso continuar com meus braços (e coração) abertos para receber quem quer chegar. Quem quer amar. Quem quer se doar. Não deixei de amar ninguém. Pelo contrário. Amo ainda mais. Porque aprendi a me amar. E dou aquilo que tenho comigo. O amor que me tenho é o mesmo amor com que te amo. Só. Se te cuido, cuido como se estivesse cuidando da minha própria vida. Se te toco, toco como se estivesse tocando o meu próprio coração. Se te abraço, abraço como se estivesse abraçando meu próprio corpo. E assim eu sigo cuidando... De mim. De ti. E de nós.


sábado, 1 de dezembro de 2012

Coração borrado


– Não fique tão perto assim.
– Assim como?
– Assim, desse jeito que você está.
– E como eu estou?
– Você está encostando sua pele na minha. Eu posso sentir.
– Mas é tão suave e eu quase não sinto a sua pele.
– Eu sei que pra você é suave e é quase nada. Mas quando a tua pele encosta de leve na minha eu sinto que vou explodir e te ferir com meus espinhos.
– Calma. Você não vai me fazer mal.
– Tenho medo de te machucar. Te quero demais. Te sinto demais. Te desejo demais. Tudo grita em mim. Enquanto você faz silêncio eu estou gritando com meus olhos, com meus lábios, com cada centímetro da minha pele. Meus pelos ficam eriçados quando a sua mão encontra a minha nuca. Desejo me deitar sobre o seu corpo e me deixar ali pra sempre.
– Você está bem?
– Não, eu não estou bem. E não queria te dizer como estou e os motivos de eu estar assim agora. Só queria que você me olhasse nos olhos e entendesse tudo aquilo que não sei dizer. Estou cansada.
– Cansada do que? Me diz.
– Cansada de dizer tudo. Cansada de me explicar sempre. Cansada de ficar dando nomes às minhas insuportáveis e inúmeras angústias. Cansada de ser incompreendida. Cansada de pedir. Queria não precisar pedir. Queria receber sem pedir. Queria que você apenas me desse colo e não me pedisse palavras ou explicações lógicas. Só quero descansar.
– Então vem cá. Senta aqui no meu colo.
– Mas eu pedi antes. Eu te disse que queria. Você só está me oferecendo seu colo porque eu praticamente te implorei isso.
– Não importa. Para com isso agora! Eu te quero.  E mesmo que eu não diga tudo que você quer ouvir, saiba que eu te quero. Estou aqui agora. E te quero. Entendeu?
Semicerrou os olhos. E chorou. Ele a pegou pelos braços para junto do seu peito e colocou-a em seu colo. Ela borrou a camisa dele com o rímel que havia passado antes de sair de casa. Eles pretendiam sair para uma balada. Mas ficaram. Ficaram ali. Onde o amor aconteceu em lágrimas, colo e silêncio. Ele ficou com o coração borrado pela imensa necessidade que ela tinha dele. E ela ficou com o coração leve, pois no silêncio, e no tocar de seus corpos, todo peso que havia sobre ela foi consumido pela certeza do amor que ele tinha por ela.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Despedidas


Ainda era cedo para despedidas. Sempre é cedo quando se trata de quem a gente ama. Não há em nós o desejo de dizer adeus. Mas as despedidas são inevitáveis. Um dia a vida chega ao fim e precisamos deixar o outro ir. Os laços que nos seguram nesse mundo são tão frágeis. De repente, o laço se rompe como num piscar de olhos. A pessoa que você mais ama parou de respirar, deixou esse mundo, assumiu um corpo frio e sem vida. Era cedo. Cedo demais. A morte nunca se encaixa no nosso cotidiano. Vez em quando parece até que ela nem existe. É como aquele parente distante que raramente aparece pra fazer uma visita inesperada e indesejada. A morte não é educada e nem manda carta avisando antecipadamente que vai chegar. E é por isso que você se assustou tanto quando recebeu a notícia mais triste que seus ouvidos poderiam receber. Ele morreu. Sem chorar o pouco tempo que ainda lhe restava. Sem pensar com você tudo aquilo que vocês já viveram juntos. Sem te abraçar forte e dizer que te ama muito e quer te ver feliz sempre. Ainda que ele não esteja ali fisicamente para te acompanhar. Você só lembra do último encontro e de cada detalhe nele. Você tenta lembrar se disse que o amava e que você se sentia bem em estar com ele. Não houve tempo para um pedido de perdão pelas pequenas coisas que você disse que talvez não soaram muito bem aos ouvidos dele. De novo você tenta se recordar se em algum momento você já pediu perdão. Mas, a dor é muito forte, e o desejo de que tudo aquilo seja apenas um pesadelo te sufoca. Não dá pra pensar em mais nada. Você só quer que ele esteja vivo e te esperando. Ele está. Mas sem vida. Sem respiração. Sem o calor no corpo. Sem o suor escorrendo pela pele. Você tenta se livrar desse pensamento. Você tenta acreditar que ele estará lá te esperando com vida. Mas não está. É impossível aceitar que alguém tão especial e querido se foi. Seremos sempre inconformados com a morte. Não queremos jamais dar espaço a ela. Ela não cabe. Mas sempre encontra uma maneira de se encaixar. E quando se encaixa a gente se desencaixa do mundo. Perde o chão. Perde a direção. Não é um sonho e nem um pesadelo. Quisera fosse mesmo. Mas é real. E a realidade dói muito. A dor é sempre constante. Ela vem espreitando de mansinho. Chega no fim de tarde.  Ao deitar das sombras da noite que leva todos os dias o brilho do sol. Você espera que com o chegar da noite ele também chegue. Abra a porta. Sorria com um olhar meio cansado da labuta do dia-a-dia. Estenda-te os braços e espere que você corra ao seu encontro. Mas só lhe resta as lembranças que se escondem no baú mais bonito que é a sua memória e seu coração. As lembranças não curam a dor da saudade. Mas elas são um refúgio dessa dor tão grande que a saudade lhe causa. Nelas mora o amor acontecido em pequenos gestos. Os gestos que preenchiam o vazio dos dias. Há alguns buracos impreenchíveis que só aquela pessoa podia preencher. No entanto, o amor se mantem vivo até quando a vida chega ao seu último suspiro. Nem a morte é capaz de matar o amor. O outro se vai, mas nós ficamos. E ficamos com o amor que sentimos. O amor que mantem viva todas as lembranças da pessoa amada. A saudade só existe no coração de quem realmente ama e nunca deixará de amar.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Liberdade


Leva-me. Agora. Estou aqui. Pode me levar. Cure minhas asas quebradas pela desesperança desse mundo tão feio e cruel. Rasgue todas as roupas que me vestem a alma. Quero voar. E quero voar completamente nu. Dispo-me totalmente dos meus medos, traumas, inseguranças, incredulidades. Deixo tudo cair aos meus pés e diante dos teus pés faço uma simples prece. Liberta-me. Pois agora só me resta o desejo imensurável de desprender meus pés do chão e saltar num voo sem fim. Acredito que posso voar. E porque acredito nesse momento começo a voar até os lugares que jamais seria capaz de ir. Meus pés jamais conseguiriam ir até ali. Então minha alma voa livremente sem medo de cair, sem medo de alguém puxar de volta e dizer que não pode ou não deve mais. Há ainda algo que quer me prender. Mas digo a mim mesmo que preciso ir. Sou livre. Apesar de ter nascido preso nessa condição existencial. Sei que posso me libertar até de mim mesmo. Ser livre é muito mais que poder fazer tudo o que eu desejo fazer. Ser livre é me libertar das correntes que me prendem dentro de mim mesmo. As correntes que me prendem no abismo profundo do ódio e do desamor. E são essas corrente que me puxam para baixo. Sei que posso. Sei que consigo. E nada pode me impedir. Há amor pulsando em mim. Mesmo quando o dia está escuro e não consigo ver além dos muros da minha superficialidade. Sei que posso escalar esses muros. Quanto mais muros você levanta, mais eu tenho vontade de ir além deles. Saber o que há atrás deles. Quero e preciso ir.  O medo não apenas me prende como também me enclausura dentro de mim. Medo de sofrer. Medo de deixar doer. Medo de chorar. Medo de cair. Medo de ralar os joelhos no chão. Medo de não conseguir voar. O medo me impede de viver e ver a beleza que há na vida. O medo deixa tudo escuro. E até o que é claro acaba me assustando. Perde-se a visão do caminho e não se sabe mais para onde ir. Ou melhor, o medo não me deixa ir. O medo só me faz ficar no mesmo lugar. Quando não se enxerga nada, a melhor opção que uma pessoa encontra, é permanecer onde está. Pena que a vida não para só porque estou com medo. É natural sentir medo. O que não é natural é me deixar dominar por ele. Não há domínio que vença a força do amor. Sei que colocastes amor em meu coração. Esse amor me faz completamente livre. Quebro correntes. Escalo barreiras. Liberto-me de mim. Só assim por ir. Só assim posso voar. Ver além do que mundo tenta ilusoriamente me mostrar. Sei que as pessoas são mais do que mostram. Além de um sorriso há muita tristeza sufocada no peito. Sei que posso ajudar, estender a mão, ajudar a sentir, dividir a dor e o peso. Não me pergunte como. Mas, se me perguntares como conseguirei fazer tudo isso, a única resposta que terei será esta: o amor. Ah, o amor me levará. E a fé me dará asas. Só assim posso voar. Só ama quem acredita. Eu acredito em você. Eu acredito em mim. Eu acredito em nós.


quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Não é explicável


Eu só deveria dobrar meus joelhos e levar minha cabeça ao chão. Mas nem isso consigo agora. Então simplesmente deixo minha alma se derramar como um vaso que acabou de ser lançado ao chão. Ao se chocar com o piso o vaso se quebra completamente, se transforma num monte de cacos e a água se espalha. Deixo-me cair ao chão e deixo que minha alma se derrame completamente. Há só um desejo irrevogavelmente gravado em minh'alma. Ser livre.

Derramo-me... receba-me... toma-me... enfim.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Confissões de um menino com dores na alma


Tudo o que eu mais queria era te ter aqui comigo. Bem pertinho de mim. Queria a tua pele roçando na minha de mansinho, me lembrando que não estou sozinho e que o mundo não existe quando estamos juntos. Talvez exista, mas de uma forma mais leve. É, o mundo realmente me pesa muito. As pessoas, seus conceitos, seus valores, seus preconceitos, suas regras, sua ditadura do certo e errado.
Não sei o que é errado agora. Não me interessa saber neste instante. Sei o que é certo. Ser feliz. É certo ser feliz e nada pode ir contra isso. Nem os maiores moralistas ou falsos moralistas que existem nesse mundo. Ninguém pode mais apontar o dedo na minha ou na sua cara para nos dizer que o nosso querer é feio, é pecado ou errado. Eles não sabem e acho que jamais saberão o que é ser feliz de verdade. Desisti de ser meu próprio obstáculo. Porque sim. Porque eu era meu maior empecilho. A felicidade me estendia as mãos e eu recusava. Pensei que o convite não seria bom. Mas era bom. Agora sei o quanto é bom confiar na felicidade. Se soubesse antes, teria dado as mãos pra ela e teria ido pelo caminho que ela queria me levar. Mas não há tempo para lamentos. É estranho, mas meu medo me empurrou para mais perto da felicidade. Meu medo de ser feliz me preparou para uma escolha consciente. Meus pés sabiam onde estavam pisando. Não estava calcando o escuro. Sei que não sei absolutamente nada sobre o que acontecerá comigo depois de todas as minhas escolhas. Nem quero saber. Consequências sempre existirão. Não existe uma separação entre a escolha e a consequência. No entanto, nem ela me preocupa agora. O que mais me preocupa é ser feliz. É saber-me inteiro e feliz. É saber-me em paz e com coração repleto de amor.
Há um medo tão grande mim. Tenho medo de não conseguir amar. A falta de amor me assusta. Tenho medo de quando te olhar nos olhos e não me encontrar mais neles. Tenho medo da imagem do seu sorriso, seu olhar, seu rosto não caberem mais em meus olhos. Tenho o agora, mas tenho medo do depois. Querendo ou não, o futuro sempre nos amedronta. Porque ele nada mais é que uma escuridão diante de nossos olhos trêmulos e ansiosos por saber o que virá depois. Depois, eu não sei. Mas, agora, sei que possa fazer algo. Posso dizer-te o quanto quero ser feliz. O quanto quero amar. O quanto quero ter um coração bom. Um coração que seja livre desses pesos. Mágoas. Decepções. Desafetos. Apesar de saber que tudo isso está incluso nesse imenso e infinito mar, chamado por nós, de vida.
Se eu não mergulho, não vivo. Se fico na margem observando, a vida segue sem que eu viva. Quero mergulhar mesmo não sabendo nadar. Mas a gente só aprende a nadar quando entra no mar. No contato com a água. No tentar constante. A vida acontece nessas tentativas de não me afogar. Já tive uma boa quantia de quase afogamentos. Não foi bom. Não é bom sentir que suas forças estão acabando e que você não consegue fazer nada para se manter. Mas sempre vejo uma esperança. Há sempre alguém que também está aprendendo e que me oferece ajuda. Mesmo não sabendo muito bem, há sempre alguém que não me deixa e não nos deixa morrer afogados.
Só quero que a vida aconteça. Mesmo vendo o mundo lá fora me olhando com nojo e me julgando pelo que sou. Penso que eles devem ter esquecido de fechar os olhos e se olhar por dentro. Todo mundo tem sua podridão. Todo mundo tem os seus fedores. Tem gente tão podre por dentro achando que vive a vida mais bonita que existe. Mas está quase morto. Ou já morreu. Que triste morrer em vida. Confesso-te outro medo meu. Tenho medo do não-sentir-nada. Tenho medo de morrer mesmo em vida. Tanta gente tem medo da morte do corpo. Tenho medo que minha alma morra e fique sepultada dentro desse corpo, apenas esperando o fim.
O amor. Ah, o amor é o que mantem minha alma respirando. Preciso desse oxigênio. Toda vez que me faltar o ar vou me recordar que estou precisando amar mais. Amar. Sim, simplesmente amar. Não esse amor banal. Não esse amor de novela das oito. Amor de verdade. Aquele amor mansinho. Amor que chega e fica. Amor que chega, me abraça, me descansa, mas, vez em quando, me cansa. O amor é assim. Descansa. Cansa. Depois revigora suas forças. Amor é algo que jamais uma pessoa conseguirá entender ou explicar. Pois se não ele deixará de existir em nós.
Se o mundo lá fora carregasse um pouquinho de amor dentro do peito, as coisas seriam bem mais leves e coloridas. Mas não é bem assim. Nem todos estão dispostos a amar e se deixar amar. Tem muita alma acinzentada que não se deixa colorir. Se eu pudesse, derramaria sobre todas essas almas as tintas mais coloridas que existem na aquarela da vida. Queria ver o mundo cheio de cores. Essas cores vivas. Essas cores cheias de felicidade. Deixa eu deitar sobre o teu corpo e colorir a tua alma nua com as cores infinitamente lindas que existem no amor. Por favor...

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A vida canta e minha alma dança


Tanto querer e desejar me dominam e me consomem e me dão uma tremenda fome. Não sei se gasto todas as minhas forças gritando, suplicando e invocando por alguém que liberte minha alma dessa paralisia. Ou se desisto e me entrego e desfaleço completamente ao chão. Se eu gritar, acho que ninguém me escutará, pois estou preso aqui dentro. Querendo. Desejando. Necessitando. Mas há paredes comprimindo minha alma. Meus gritos não passarão de um minúsculo sussurro. As paredes são o meu corpo fragilizado. Apenas um reflexo da alma que está mergulhada dentro de mim. E, se não bastasse as minhas limitações, tenho em meu encalço os passos de quem foi sem ir. Daqueles que, com palavras, gestos, olhares, e, de tudo um pouco mais, me fisgam, me retêm, como uma pedra no meio do percurso de um rio que flui. Lembranças dolorosas me assombram e me fazem correr pra debaixo da cama. E a vida anda, anda, anda. E me chama. E vez em quando até reclama. Vejo a vida ir e com ela desejo também ir. A vida me chama a dançar. Mas, vida, eu não sei dançar. Ouvi alguém dizer que, para viver, a gente tem que dançar conforme a música. Porém, não sei acompanhar o ritmo dessa música. A música vai pra um lado e meu passo vai para o lado contrário. Sou um pouco descoordenado e tão desajeitado. Vão rir de mim. Posso até tropeçar e de repente cair. Mas a vida é tão cheia de sabedoria, me olha entre os vincos de sua enorme face, e diz que meu corpo não precisa saber passo algum, nem ritmo, nem compasso. A vida me segredou baixinho (e tive que fazer um esforço enorme pra ouvir). Basta deixar sua alma dançar. Foi o que a senhora vida me disse. Engoli cada palavra bem devagarzinho para que o sentido de cada uma delas não se perdesse no ar. Deixa. Deixa-me. Me deixa! Deixa então que minha alma dance livremente. Não prenda mais os meus passos. Não fique mais no meu encalço. Se não queres ir, então, por favor, deixe-me ir. A vida está cantando com tanta maestria. A vida está cantando. Quando ouço essa música, minha alma sente vontade de saltar dos limites do meu corpo, libertar-se de todas as pregas que ainda existem, e simplesmente dançar. Já que meu corpo não dança, minha alma pode dançar. Agora sei. Minha alma quer dançar. E enquanto me entrego ao mover da dança sinto uma leveza impressionante. Sinto que vou seguindo e deixando cair ao longo do caminho todos os pesos que não me servem mais. Quero a leveza de viver. Quero ir sem me arrastar. Quero ir dançando, cantarolando, amando. Pois não importa o que venham a me dizer e nem o quanto tentem me derrubar. Sei que a vida fica mais leve quando me permito amar. Amar e dançar.

A vida canta. Minha alma dança. E ama...


terça-feira, 6 de novembro de 2012

Foi bom te amar


O tempo nem sempre faz o que as pessoas erroneamente costumam dizer. Agora entendo que, pode passar o tempo que for, você sempre estará cravado em minha memória. Mais que isso, você sempre estará cravado dentro de mim. Você foi nada mais que uma semente plantada no meu jardim interior. No meu jardim secreto que não havia sido violado por ninguém. Tuas mãos não bateram na porta do meu jardim. Não foi preciso pedir licença para entrar. Você entrou e se plantou em mim. Germinou. Deu flor. Reguei a terra do meu jardim com a esperança que eu tinha de um dia você ser pra mim, tudo aquilo que eu era pra você.
Em vão. Tudo em vão. Agora sinto que foi em vão. Um dia poderei mudar de ideia. A vida pode me surpreender e me mostrar que você ainda pode ser mais que alguém que me controlava. Aí você cresceu em mim. Cresceu mais um pouco. Criou raiz. A minha batalha foi perdida no começo. Ao contrário de muitas batalhas que chegam à derrota no fim. Não, a minha derrota se deu justa e inevitavelmente no começo. No começo, sempre fazemos tudo no calor e na intensidade do sentimento. Andamos às cegas achando que escolhemos o caminho seguro. Enquanto isso, caminhamos em meio às serpentes venenosas que querem injetar em nós uma substância que pode ser fatal. Mas esse veneno não mata o corpo. O veneno tão temido mata a alma. Aos poucos. Gota por gota. Não fui picado por elas. Uma luz brilhou no caminho antes que isso pudesse acontecer.
O que aconteceu comigo? Onde está a sanidade de uma pessoa quando ama? E a vida me enche as mãos, mais uma vez, de inúmeras perguntas que nem sei se serão respondidas. Mas pergunto. Não me canso de perguntar. Mesmo sabendo que as perguntas nada mais são que um desejo absurdo de entender porque aconteceu comigo. Por que tinha que ser comigo? Por que tinha que ser você? Por que tinha que ser nós? Mesmo que esse ‘nós’ só tenha existido no meu mundo cheio de ilusões e esperanças falsas.
O tempo ia passando e você fincava suas raízes em mim. Dói ser enraizado por alguém. O amor dói. E a indiferença dói mais ainda. Ai. Ai. Ai. Como doía quando minha necessidade tocava na sua indiferença. Tão estranho saber que alguém se enraizou em você, mas esse alguém não te pertence. O que acontece comigo? Alguém me explique porque você não sai de mim? Não ouço ninguém me responder. O amor é mesmo um mistério insondável. Quanto mais avanço, mais me surpreendo. Você me surpreendeu alguns dias atrás. Se você pensa que senti aquele frio na barriga ou que corei como sempre fazia, você está totalmente enganado. Foi normal. Não me fez mal. No entanto, sei que você permanece com suas raízes em mim. Dentro de mim. Nada vai e nada poderá mudar isso.
Aconteceu. Não sei se a vida quis assim. Não sei se era pra acontecer. Não sei se devo acreditar no destino. Só sei de uma coisa. Eu quis. Tudo aconteceu porque eu quis. Seria muita covardia da minha parte dizer que não, tecer várias desculpas, fazer rodeios, dar várias e várias voltas. Não adianta. Sempre chegarei ali, no meu jardim, naquela árvore que cresceu. Mas que, de alguma forma, morreu. Acho que quando um amor morre, consequentemente, os frutos caem de tão maduros que estão, as folhas secam, e, só restam os galhos secos. E a raiz. É claro, ela permanecerá sempre ali. Ela sempre me lembrará você.
O amor é essa semente que a gente permite que plantem em nós. Mesmo não sabendo se dará fruto. Mesmo não sabendo se o fruto será bom. Mesmo não sabendo se a árvore resistirá ao duro e rigoroso inverno da vida. Para só depois, quando vier a primavera, voltar a ter sua folhagem e seus frutos naturais. Quem sabe o amor que eu tinha por você só esteja passando por esse inverno. Será? Se for, esse inverno está muito longo. Ou talvez, essa seja só mais uma forma de esconder mais uma falsa esperança que está tentando se acender em mim. Não permito.
A minha vida precisa seguir. Ainda há muito espaço em meu jardim. Sei que alguém poderá entrar a qualquer momento. Quero estar preparado. Com o jardim pronto para receber uma nova semente. Quero continuar sem persistir nessa tentativa inútil de regar a árvore que já está morta. Morreu. Acabou. Por mais difícil que seja entender isso. Preciso continuar. Vou continuar vivendo. Pode deixar, jamais vou me esquecer de você. Não tenho essa capacidade. E, quer saber mais uma coisa? Se eu pudesse escolher entre te esquecer completamente e continuar com sua lembrança em minha memória. Eu escolheria a segunda opção. Porque sim. Porque, além de tudo, você me fez bem. Você fez com que eu me encontrasse comigo mesmo. Com a pessoa que eu não queria encontrar. Estou repleto de lembranças. Algumas doem. Outras nem tanto. Já outras nem doem mais. E, as outras, as bonitas, ainda me fazem respirar fundo e pensar com leveza: foi bom te amar.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

A minha sina


Não, não diga nada. Por favor, não diz. Você não precisa me dizer mais nada. Pode continuar com seu silêncio que antes era insuportável. Mas agora não é mais. Isso mesmo. Teu silêncio se tornou suportável. Dói. Ainda dói. Mas me acostumei. Assim como um organismo se acostuma com o mesmo remédio. No começo, seu silêncio me doía muito. Porque eu tenho urgência de palavras. Preciso de um sim ou de um não. Mas você me veio (sem vir) com esse talvez. O silêncio esconde um talvez. E o talvez me limita os passos. Não sei se vou e nem sei se fico. Na dúvida, escolhi ficar. Você me prendeu em seus braços. Não consigo ir. Não consigo prosseguir. Ainda espero uma resposta. Ainda espero que você me diga se quer ou não. Se fosse antes, eu diria que só espero um sim. Mas não. Eu escolheria o não, somente para me ver livre das suas amarras invisíveis sobre mim. Pois, enquanto fico aqui, atado a você, a vida está passando. Isso é certo? Diga-me se está certo eu ficar aqui esperando alguém que está calado por seu próprio egoísmo. Deixe de ser egoísta. Diz logo que não quer. Não precisa agir mais com essa indiferença maquiada de beijos vazios e palavras forçadas. Eu sou livre. Você é livre. Apesar da gente, às vezes, sentir vontade de prender o outro em uma gaiola para ele ser só nosso. Mas ninguém é propriedade de ninguém. Detesto quando me chamam de meu-isso ou meu-aquilo. Não sou pertença sua. Assim como você não é minha. Então, por favor, liberte-me. Preciso ir. Você é tão seco, tão frio, tão sem vida. Queria me proteger de você. Mas quando você me olha fico desprotegido. Meus braços são incapazes de te afastar. Porque, infelizmente ou felizmente (não sei), ainda te quero. E o meu querer errado (ou certo) me prende aqui. Tantas incertezas. E a vida escorre diante de mim. Meus passos querem ir ao seu encalço. Mas continuo. Aqui. No mesmo lugar de sempre. Esperando o que talvez nunca chegará. Procurando por quem não quer ser procurado. Falando para quem não quer me escutar. Dando amor para quem quer ser amado. Mas não quer amar. Só quero ir. Ir. Porque ficar não é a minha sina. Escolho ir. Pois há muita água a ser secada. Perto de você sinto que é muita, muita, muita água pra pouca vontade de secar. Quando se ama, se sacia a sede do outro. E quanto mais a pessoa é saciada, mais ela quer se saciar. A minha sede não é para você. Nada em mim é pra você. Eu vou. Com o peito um pouco mais fechado. Com cuidado. Mas eu vou. Até logo. Fique bem. Por favor. Fique bem. Eu vou tentar ficar bem. Porque, afinal, talvez a minha sina seja essa. Amar errado até encontrar o amor que não seja o certo, mas seja recíproco. É isso que importa.


quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Numa esquina da 25 de março


Clara tinha uma alma clara. Alva.
Jonny tinha uma alma acinzentada. Escura.
Certo dia, os dois se trombaram em uma dessas esquinas da 25 de março que sempre estão superlotadas de pessoas.
Clara ficou sem graça. E corou.
Jonny já estava irritado. Como sempre encontrava uma forma de colocar pra fora sua insatisfação com a vida. Ele olhou pra Clara com raiva. E deixou escapar um áspero não-olha-pra-onde-anda-não?
Clara correspondeu o olhar de Jonny. Seu olhar passou de timidez para o de surpresa.
Quem ele achava que era pra falar assim com ela? Será que ele não percebeu que foi um acidente? As ruas estavam cheias e todos estavam praticamente se empurrando pra poder andar. Qual pessoa não vê isso?
Ele, Jonny. Jonny vivia preso em si mesmo. Em seu mundo particular só existia suas decepções, desafetos e agressividades. Ele nunca deixou escapar um olhar de ternura.
Clara, apesar do susto, olhou com ternura pra ele e sorriu. Olhar iluminado e aquecido. Sorriso desconcertante. Não havia quem resistisse à ternura de Clara. Clara era transparente.
Jonny deixou de ser Jonny naquele instante.
Aquele olhar e aquele sorriso cortaram o fio que o mantinha preso dentro de suas amarguras. Ele não sabia como explicar aquela sensação. Claro que, como um bom machista que era, ele jamais iria acreditar nesse blá-blá-blá de amor à primeira vista. Ele não sabia o que havia mudado, mas alguma coisa mudou naquele momento em que aquele olhar olhou pra ele como nenhum outro havia olhado antes.
Há olhares que nos roubam e nos devolvem. Clara roubou o Jonny casca grossa e devolveu o Jonny com algo diferente que nem ele sabia o que era. O que seria?
Clara continuou com seus olhos fixos em Jonny sem dizer nada. Mas dizendo tudo o que Jonny precisava ouvir. Seu olhar pedia calma e acalmava. Seu olhar pedia que o outro se desmontasse e desmontava imediatamente. Clara, doce clara. Clara, com a alma clara, clareava as almas escurecidas.
Jonny carregava em seu peito a tristeza de ter sido abandonado, sem nenhuma explicação, por sua namorada, Lídia. Tudo que ele tinha era dela. O pouco, ele sempre dizia, que tinha era dela. E Lídia levou esse pouco com ela. No dia em que ela acordou antes dele, se vestiu, escreveu bilhete de despedida, deixou ao lado do corpo nu de Jonny. O bilhete diante dos seus olhos anunciava sem anunciar. Uma partida sem explicações. Algo que ele jamais conseguiu entender. Naquele momento, o espaço vazio na cama deixado por Lídia, tomou posse de seu coração.
O coração vazio e nunca preenchido. Mas, de alguma forma, ele sentia que aquele olhar varava as cortinas que ele havia colocado para se proteger do sol.
Os olhos de Clara eram mais intensos que o brilho do sol. E, a luz dos olhos de Clara, começaram a dissipar a escuridão da alma acinzentada de Jonny.
E tudo começou. Em silêncio. Na troca silenciosa de dois olhares. Um iluminado e o outro carecendo de luz.
Olhar alguém nos olhos é construir uma ponte entre dois corações.
Clara fez isso quando se atreveu a olhar para Jonny. Ela não sabia, mas seu olhar acordou a alma adormecida de Jonny. Ela construiu uma ponte e chegou onde ninguém conseguia chegar. Sem esforço. Sem pedido de licença. Sem tocar a campainha.
O amor é mesmo assim. Chega de mansinho. Sem avisar. Sem mandar aviso prévio. Sem bater na porta.  Chegou sem que Jonny pudesse esperar. Ele, que tanto se protegia, se viu completamente desprotegido diante da intensidade daquele olhar. Sentiu-se nu sem que lhe tirassem as roupas do corpo.
E, dali pra frente, já não sabia mais como seria. O amor sempre nos reserva surpresas inesperadas. O amor vez em quando é incerto.
O amor chegou de novo. Mas esse amor é novo. E Jonny sabia bem disso. Apesar de não entender.
Jonny ainda estava anestesiado pelo olhar de Clara, quando percebeu que ela andava em sua direção. Um calor intenso tomou conta do seu corpo. Sua garganta ficou seca. Seu coração perdeu o compasso.
Clara estendeu a mão.
Demorou um tempo para que Jonny percebesse a mão estendida de Clara.
Ele sorriu timidamente como quem quer se desculpar.
Jonny estendeu, enfim, a sua mão para tocar a mão de Clara.
Ela sorriu mais uma vez.
- Desculpa. Foi sem querer. Meu nome é Clara.
- Não tem problema. Acontece. Eu que peço desculpas por ter sido tão grosso. Meu nome é Jonny.
- Prazer, Jonny!
- Prazer, Clara.
- Vamos começar de novo? Não sei por que, só sei que quero falar com você.
- E há tanto a se falar.
Os dois saíram juntos, mas separados por uma certa distância.
Clara não sabia o que havia feito. Talvez nunca saiba de tão grande feito. Mas fez. Está feito.
E o resto? A vida dirá.


segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Não sei te querer sem deixar de me querer


Eu estava bem. Eu estava feliz. Minha felicidade era real. Não era euforia. Estava feliz porque havia me encontrado. Estava em paz. Estava me cuidando. Ou melhor, eu estava aprendendo a cuidar melhor de mim. Não é que aprendi a ser egoísta. Só aprendi a cuidar melhor do meu jardim. Aprendi a fechar a porta quando a visita é indesejada ou representa algum risco para ele. Aprendi a mandar embora quem não me faz bem, quem não é honesto comigo, quem não é reciproco. Aprendi que não posso deixar as pessoas entrarem nele, pisarem na grama e nas flores, derrubar os bancos, jogar seus lixos pessoais, e, depois de muito destruí-lo (e me destruir), irem embora como se não tivessem feito absolutamente nada. Quisera eu ficar com nada em relação aos prejuízos que essas visitas me causam. Mas não quero contabilizar os danos. O que sei é que estava tudo bem até o dia em que você chegou.
Você bateu na porta do meu jardim com um olhar. Pediu licença entre um passo e outro que te aproximava de mim em silêncio. Eu abri as portas retribuindo o seu olhar. Você entrou agradecendo com um beijo. E tudo começou. Eu te quis. Você, aparentemente, também me quis. Só entra quem quer entrar. Não obrigo ninguém a entrar no meu jardim. Depois que você entrou, eu te quis mais. Quis suas palavras acalmando minhas urgências. Quis seus braços envolvendo e dando segurança ao meu corpo frágil e tão inseguro. Quis fazer dos seus braços o meu perto seguro. Mas só que eles são o meu porto (in)segero. E me aventurei em fazer do seu abraço a minha morada. Esse negócio de querer alguém é tão difícil. Não se lidar com isso. É tão difícil querer o outro sem deixar de se querer. Quanto mais te queria, mais eu deixava de me querer. Eu te queria mais e me queria menos. Eu te amava mais e me amava menos. O amor que eu me tinha se perdia quando eu te olhava nos olhos e sentia o desejo de mergulhar neles. É loucura isso. Mas muita gente viveu ou vive assim.
Amor próprio é uma coisa muita difícil de se conquistar. Principalmente quando você ama muito alguém. Tá, eu sei que a gente precisa se amar, se gostar, se cuidar e blá-blá-blá. Mas tente explicar isso pro seu e pro meu coração. Coração não entende muito bem essas lógicas e o que deve ou não fazer. Tudo bem, eu me amo, eu gosto de mim, eu me cuido. Mas confesso que te amei bastante, que te queria muito. E acho que você sabia disso. Quando a pessoa sabe que é amada, muitas vezes, ela usa isso contra a gente. Triste isso. Mas é verdade. Muita gente esnoba em vez de retribuir o sentimento. É tão estranho o amor que a gente sente ser uma arma perigosa contra nós mesmos.
Sou o meu próprio perigo. Sou o meu próprio abismo. E esse abismo habita dentro de mim. Um passo em falso e despenco. Só Deus sabe quando conseguirei me recuperar da queda. Mas, me diz uma coisa: alguém já conseguiu amar sem cair, se machucar bastante ou sem se decepcionar? Acho que ninguém. O amor também é feito de dor. Se o amor não dói, não é amor.
Sei que posso te querer sem deixar de me querer. Entendi isso. Mas meu coração é um pouco burro. Coitado dele. Ou melhor, coitado de mim. Meu coração vai e eu vou junto. Sou um João-vai-com-o-coração. Vez em quando até consigo não te querer muito. Mas logo esqueço de mim. Aí lembro mais de ti. Esqueço-me em algum lugar, esperando que você vá me buscar. Se me esqueci é porque queria te encontrar. Sabe, seria mais fácil te encontrar sem me perder. Seria mais fácil te querer sem deixar de me querer. E o que escrevo agora já está ficando tão repetitivo que acho que é uma forma de tentar me convencer que consigo me querer mais que você. Mas, vamos falar a verdade agora. Não consigo. E ponto. Um dia aprendo. Ou não.


quarta-feira, 24 de outubro de 2012

A criança escondida dentro da gaveta da alma


Sou carente. E acho que todo mundo esconde um pouco de carência dentro de alguma gaveta da alma. Tem pose de forte, diz que aguenta tudo e todos, tem a cabeça sempre erguida e o ego sempre inchado. Mas, no fundo, bem lá no fundo da alma, dentro de uma pequena gaveta, debaixo de um amontoado de roupas velhas, esconde uma criança pequena e indefesa que tem medo de enfrentar o mundo de frente.
Quando a luz está acesa e tudo a sua volta te observa é bem fácil manter-se sob essa caricatura de gente grande e crescida. Mas a realidade de dentro é outra. Quando todas as luzes se apagam, você fecha as portas e fica a sós com você mesmo, a criança assustada e medrosa se revela. Ela sai lá de dentro da pequena gaveta, te dá as mãos, e, juntas, vocês duas se olham nos olhos.  Você pode reconhecer nela tudo aquilo que você tenta esconder dos outros. Seus medos. Suas angústias. Suas tristezas mais profundas. Seus traumas. Seus sonhos frustrados. O adeus não dado. A palavra não dita. O amor não acontecido. O cafuné do pai no fim do dia, que deveria dizer ao seu coração o quanto te amava. As ausências que ainda alimentam esse vazio no seu peito. Você olha bem nos olhos dela e se vê. Ela é o seu espelho. Mas o reflexo é bem diferente. É como se, por dentro, você nunca houvesse crescido. E não crescemos. Às vezes, nosso crescimento é tardio.
Uma lágrima discreta escorre por seu rosto. Aquela que você esconde para se mostrar forte e seguro. Ela alcança seus lábios e você sente o gosto amargo que está sufocado em seu peito há tanto tempo. Gostinho de remédio. Confesso que detesto tomar remédio. Ninguém gosta, né? De vez em quando tenho umas dores de cabeça que me obrigam a tomar dipirona. E dipirona tem um gosto insuportavelmente amargo. Pois é, às vezes, você e eu estamos assim. Mais amargos que dipirona. Por mais que você tente esconder, algumas vezes, o gosto amargo escorre por suas palavras ou até por seus gestos. Quem está perto sempre percebe. Você parece até ser uma daquelas pessoas-mal-amadas. Desculpa, mas, às vezes, a gente fica assim mesmo. Não adianta culpar ninguém. Isso só vai atrasar o seu crescimento como pessoa. Cuidar de você mesmo é muito melhor. Isso não é tempo perdido. Pelo contrário, vale a pena gastar/ganhar tempo com você.
Não sei o que te levou a ficar assim. Eu sei bem o que causa as amarguras em meu coração. Você, com certeza, sabe dos seus motivos. Penso que muita gente sofre por ter escolhido algo no calor do sentimento. Quando sentimos demais, acabamos confundindo as coisas. Tudo por causa da euforia. Felicidade não é euforia. A euforia é uma cortina que te esconde a consequência de suas escolhas. É claro que ninguém sabe das consequências de suas escolhas, mas a euforia e a pressa nem sempre reservam consequências boas. Muitas vezes gera arrependimento, frustração e indignação. É só olhar nos olhos da criança, que está diante de você, e comprovar isso. Você se lembra do quanto você sonhava? Você se lembra do quanto você queria ir longe? Mas seus passos desaceleraram a partir do momento em que você se viu perdido em um caminho que não era seu. Infelizmente é assim. Você já está nesse caminho e olha pra trás e só consegue pensar que poderia ter sido tudo diferente. Mas não é. Sinto muito. Tudo isso foi se acumulando dentro de você e hoje você só tem o desejo de voltar e fazer tudo diferente. É tudo sinal de uma pessoa arrependida.
Não quero te ver mais triste. Você não pode voltar no tempo e nem mudar nada do que fez. Talvez você já está casado, com filhos, com uma família aparentemente estruturada. As coisas aconteceram. Talvez aquela pessoa, que você tanto precisava pedir perdão e dizer que amava/ama muito, já se foi dessa vida sem que você pudesse fazer tudo que queria. Chore o que você tiver que chorar. Deixe que as lágrimas possam secar toda amargura que ainda existe dentro de você. Você não pode mudar essas coisas, mas você pode fazer diferente daqui pra frente. Comece a ver as coisas de outra forma. A vida precisa acontecer em você. Não deixe sua vida esquecida naquele dia em que você disse sim ou não. Você já disse. Está dito. Aceite as consequências e aprenda a conviver com elas. Rasgue seu peito um pouquinho e não tenha medo de se abrir de novo ao amor. Porque só o amor pode te ensinar a superar tudo isso. Daqui pra frente, você pode amar mais, sorrir mais, dar mais colo, mais abraço. E pedir também. O fruto do amor é a humildade. É o reconhecer que você também precisa ser amado, perdoado e compreendido. Não perca tempo com esses arrependimentos. Descubra uma nova forma de viver. Aceite que você errou. E que agora você pode concertar as coisas de um jeito bem diferente. Amando. Simplesmente amando aqueles que foram colocados ao longo do caminho da sua vida. Não negue que coisas boas também aconteceram. Você também tem motivos para agradecer e ser feliz.
Então, por favor, (desculpa se te incomodo quando peço assim) segure forte na mão dessa criancinha, aceite tudo que há nela, saia porta a fora e vá viver junto com ela. Vai fazer a criança crescer, aprender a superar seus medos e traumas, aprender a andar com as próprias pernas, a sorrir com doçura para os nãos que as esperam. Porque, no fundo, você sabe bem. Essa criança é justamente você.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Começos e finais


Começos e finais. A vida não deveria ser assim com a gente. Não entendo porque tudo tem que ter um começo e um fim. As relações, os sentimentos, as pessoas, tudo deveria ser interminável. Ninguém quer o fim. Ansiamos pelo começo, mas temos um medo absurdo do fim. Porém, a vida é inevitável e irremediavelmente assim. Não há escapatória.
Todos os dias começam e terminam. Começam com a luz do sol e terminam com a escuridão da noite. O fim da tarde é o prelúdio da noite. O sol se vai em cada dia para retornar no outro dia. Algumas pessoas são assim em nossas vidas. Chegam, nos iluminam, nos aquecem, deixam seus rastros e um dia vão embora como a luz do sol. No dia seguinte, o sol volta. Mas se a pessoa não voltar, a vida vai continuar. Não existe só uma pessoa no mundo. Impressiona-me muito algumas pessoas, que se afundam na tristeza e na depressão, porque a pessoa que elas tanto amavam se foi. Relações também podem chegar ao fim. Não há nenhuma garantia de que tudo seja sempre pra sempre. Uma coisa é você ser amado por alguém. Outra coisa bem diferente é sua sobrevivência depender do amor dessa pessoa.
Sempre achei feio ouvir as pessoas dizerem: “você é minha vida”, “não vivo sem você”. É ridículo isso. Então quer dizer que se a pessoa se for, se ela te deixar, se a relação não estiver dando mais certo, você vai desistir também de viver? A sua vida vai acabar no momento em que a pessoa partir? É claro que não. A vida não acaba quando alguém se vai. A vida continua. A vida é rio que segue e não para jamais de fluir. Mas há pessoas que insistem em levantar uma barreira no instante em que são deixadas por alguém. E, a vida, que era pra ser vivida, é adormecida dentro do corpo que acomoda uma alma aflita que não soube aceitar o fim.
O primeiro passo pra quem quer superar um fim é aceitar que acabou e que não tem porque prosseguir. Não dava mais pra empurrar com a barriga. Não dava mais pra forçar a reciprocidade de um sentimento. Não dava mais pra dizer o que o coração não sentia. Ninguém é obrigado a dizer o que não sente. Se não sente, não diga. Se não quer, fale. Mas não engane, não iluda, não esnobe. Eu-te-amo não é bom-dia. Eu-te-quero não é quero-comer. As palavras carregam um punhado muito grande de significados. É melhor um adeus que dói. Do que um eu te amo sem amor.
Você foi até aonde você deveria ir. Fez o que pode. Gastou-se. Lutou. Suou. Feriu-se. Sangrou. Tentou levar pra frente. Engoliu muita indiferença. Mas chegou o fim. Entenda isso. Não é que você é fraco. Desistir nem sempre é sinônimo de fraqueza. Pode ser coragem. Coragem de dar um beijo na face do outro e dizer que ele pode ir. Que você vai ficar bem (mesmo sabendo que vai ser difícil no começo). E desejar de coração que ele também fique bem. Porque, pra quem ama, o que importa é que o outro seja feliz. Claro que nem sempre é assim. De vez em quando dá vontade de xingar, bater, quebrar tudo  e dizer um monte de verdades. Eu sei que dá. Não é fácil aceitar que uma relação de tanto tempo acabou.
O fim deixa o mar da nossa vida muito agitado. Falta paz. Falta paciência. Mas quer saber de uma coisa? Você não está sozinho nessa. Tem muita gente que também passa por isso. E todo mundo supera. Sei que agora é bem difícil acreditar que você vai superar e que a dor logo vai passar. Tudo está à flor da pele. O mar está revolto. Você sente vontade de desistir. Mas não dá. A vida sempre nos reserva surpresas. A qualquer momento você vai encontrar a sua paz. E uma alma especial vai passar pela sua no meio dessas ruas de procuras e buscas insaciáveis. Vai te reconhecer. Vai estender a mão pra você. Você vai sentir medo de retribuir o gesto. Mas logo você estenderá a mão pra essa alma especial. E juntos vão escrever uma nova história. Sem medo do fim.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Acredite em mim


Mas acredite em mim. Essa dor que sufoca o seu coração vai passar. Não sei se será amanhã. Ou depois. Ou daqui uma semana. Ou, quem sabe, daqui um mês. Não sei. Não há tempo determinado para que uma dor passe. Sim, eu sei que é difícil. Mas todo mundo esconde um pouquinho de dor no peito. Você não é a única pessoa que sente isso. Nem eu sou. Não, não tente arrancar essa dor daí de dentro. Ela pode piorar. Eu também já tentei várias vezes, mas é em vão. Deixe que essa dor doa o quanto tiver que doer. Por pior que seja, as dores dessa vida nos ensinam muito. A dor faz de nós pessoas mais sensíveis. Pessoas que sabem amar mais e sabem ver o mundo e as pessoas de uma forma diferente. A sua dor te faz de imediato reconhecer a dor do outro. Você deixa de ser egoísta e insensível. E até consegue sentir a dor dele no seu coração. Amar é dividir seu coração para que a dor do outro não doa tanto. Porque, quem ama de verdade, não quer ver o outro sofrer. Quem ama sente uma necessidade enorme de arrancar a dor que o outro sente e tomar pra si. Sei que agora é difícil só falar e falar. A dor continua aí, dentro de você, te arranhando o coração com suas unhas enormes. Você quer gritar, mas segura o grito e fica em silêncio. Você quer fugir, correr para algum lugar seguro, até tudo passar... mas a fuga não trará soluções. Senta num cantinho. Só um pouquinho, por favor. Convide Deus para sentar ao seu lado. Chore. Fique em silêncio. Nesse momento as palavras se dissolvem e escorrem ao chão junto com suas lágrimas. Só te resta esperar. Deixa a dor doer. E só. Ela passa. Vai passar. Acredite em mim.